
Já não é novidade para ninguém, o prazer que sinto ao ler alguns dos nossos maiores nomes da escrita nacional.
Para mim, mais importante do que concordar com o que escrevem, é tentar perceber o conteúdo dos seus artigos e acima de tudo, fazer uma reflexão, não esteja eu completamente enganado.
Hoje trago-vos novamente Miguel Sousa Tavares. Não vou voltar a cair no erro de transcrever na integra, o seu último artigo do expresso.
Mostro-vos sim, quatro parágrafos desse artigo. Ele escreveu, por incrivel que pareça, tudo aquilo que eu penso sobre o caso Freeport e os seus contornos.
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Por Miguel Sousa Tavares:
Como fritar um PM em lume brando
"1 Eis o meu ponto de partida: eu não acredito que o cidadão José Sócrates Pinto de Sousa tenha, enquanto ministro do Ambiente, aceite quatro milhões (de euros ou de contos, a suspeita nunca ficou clara) para autorizar, contra a lei, o Freeport de Alcochete. Não acredito: é um direito que me assiste e que decorre não apenas da experiência de trinta anos a observar políticos por dever profissional, como também pelo conhecimento pessoal que dele tenho.
Segundo ponto: além da crença pessoal, eu desejo veementemente e como português que quem quer que seja primeiro-ministro do meu país esteja acima, largamente acima, de tão rasteiras suspeitas. Isso, porém, não impede que existindo suspeitas, dúvidas, interrogações por esclarecer, com ou sem razão, elas sejam investigadas a sério e a fundo. Acho que nenhuma outra coisa podemos desejar e exigir.
Terceiro e decisivo ponto: acho absolutamente intolerável que a investigação e esclarecimento de um assunto desta gravidade, envolvendo suspeitas deste tipo sobre um PM, acabe - uma vez mais! - por flutuar, sem prazo nem dignidade alguma, nesse limbo de maledicência e de justicialismo popular onde invariavelmente vegetam ultimamente todas as investigações deste tipo, entre a incompetência do Ministério Público e a leviandade de uma imprensa que vive para o escândalo e que se está borrifando para o que seja o Estado de Direito. Por outras e mais cruas palavras: é intolerável que, uma vez mais, o palco principal da investigação seja ocupado, não pelos seus progressos e conclusões, mas pelas notícias sobre incidentes laterais, estados de alma dos investigadores e insinuações sobre pressões externas - tudo, como sempre, alimentado por sistemáticas fugas de informação que, para vergonha nossa, toda a gente sabe de onde vêm e mesmo assim se repetem constantemente."
(...)
"Tanto quanto sei, seguindo as coisas de fora, todas as suspeitas contra José Sócrates assentam na existência de um vídeo onde um tal Charles Smith, para tentar justificar perante os patrões do Freeport uma quantidade de dinheiro que desapareceu em Portugal, o explica dizendo que teve de corromper o então ministro do Ambiente. Ora, o sr. Smith está para aí, à disposição dos investigadores, que aliás já o interrogaram algumas vezes. Permitam-me os senhores magistrados que diga que não vejo aqui nenhum bico de obra: ou conseguem que o sr. Smith prove como e quando pagou a Sócrates e qual o destino do dinheiro, ou não o conseguem e, então, só lhes resta uma coisa a fazer: arquivar o processo contra Sócrates e prossegui-lo contra o sr. Smith e demais envolvidos, por crime de falsas declarações e muito provável roubo, em benefício próprio, dos tais quatro milhões. Não alcanço porque são precisos cinco anos de adormecidas investigações e mais três meses de histeria investigatória para concluir uma destas duas coisas. "
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PS - Achei estes quatro parágrafos importantes, por isso lhes dou o devido destaque. Quanto a este caso, apenas voltarei a falar sobre ele quando existir, finalmente, alguma resolução.